LX [falando sobre músicas]
Escrevi há poucos dias mas não tinha postado aqui, não sei bem por quê. Agora eis.
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Toda música tem seus parentes mais antigos com os quais guarda até mais afinidade do que com as suas contemporâneas. Hoje é comum apresentar música medieval ou renascentista ao lado de certos estilos de música escrita hoje, ou no século XX. Hoje mesmo, ou ontem, li sobre um concerto em que Steve Reich era colocado ao lado de Byrd e Josquin. Vários intérpretes atualmente gravam música medieval e de Arvo Pärt ou John Tavener (o nascido em 1944, não o Taverner renascentista).
Estava viajando em condescendência quando imaginei que o que eu escrevo talvez fosse colocado, pela eventual bondade de algum intérprete, com Debussy ou Satie. Não porque minhas coisas sejam tão boas quanto as deles, mas creio que os universos se identifiquem, embora isto varie conforme a peça [minha] da qual se estiver falando. Algumas exceções aparecem, acho que a Toccata de 1998 podia estar junto com Schoenberg num concerto de música cinza, ou melhor: talvez com Webern, para mostrar que na verdade ela quer ser colorida. Não olhem feio: o cinza em Schoenberg vem dos olhos de Messiaen, e, puxa vida, estou apenas divagando um pouco – em condescendência, como falei.
Tenho curiosidade de saber o que Debussy acharia do que eu componho. Mas admito que, se ele não gostasse, eu passaria, de uma hora para outra, a ignorar sua opinião. Ele poderia achar muito repetitivo, já que no tempo dele não se repetiam tanto as coisas; poderia achar isso para bem, poderia achar isso para mal. Talvez até me perguntasse de onde tirei essa idéia de repetir tanto. Aí eu lhe mostraria Philip Glass e ele passaria meses extático. Ei, Claude, parece eu mesmo com dezessete anos.
Já pensei nisso com Bach, mas não tive nenhuma idéia muito delirante. Tudo depende: ele saberia que eu nasci 295 anos depois dele? Ele teria alguma idéia no que aconteceu nesses anos? Difícil saber.
Em alguns momentos mais obscuros chego a pensar que nenhum europeu gostaria muito da minha música, e justo eu, que costumo evitar generalizações, a não ser que sejam divertidas. Devo ter sido influenciado por uma pianista francesa que vi uma vez dar uma palestra. Falando de uma peça de George Crumb, eu acho, mostrou um trecho tonal melodioso e disse: trop americain, trop americain. Não sei, vou esperar o primeiro europeu ouvir algo que eu tenha escrito para dizer alguma coisa além disso.
Aonde quero chegar com isso tudo? A lugar nenhum; portanto, não espereis, ó relevância, que eu vos coroe ao fim destes parágrafos.
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