domingo, novembro 25, 2007

A nona menor - I



Uma vez, escrevendo num outro blog, ilustrei um post (sobre algo que não Música) com um acorde, este mesmo que está ali acima. Duas quartas em distância de nona menor - a descrição fria.

Um rapaz, leitor, que entendia de Música, me perguntou se aquilo era uma provocação.

Não me irritei, de maneira nenhuma, com o comentário... Sabia que ele era muito ligado à música mais antiga, do século XVIII para trás. Um acorde assim poderia mesmo soar (ou parecer) uma provocação. Entretanto, naturalmente não é.

A nona menor é um dos personagens principais da história da música atonal. Não que ela estivesse ausente da música anterior, claro. Ela aparecia basicamente como um acréscimo ao acorde de dominante com sétima menor - que se transformava, então numa dominante com sétima e nona menor, V7 9> ou D7 9>. Em geral tratada como apojatura; supunha-se que essa nona menor fosse descer e se transformar numa duplicação da fundamental. Em todo caso, já se conhecia seu poder expressivo.

Mas depois ela ganhou um papel de, digamos, "variação" da oitava, já que a oitava não era um tipo de sonoridade que agradasse muito os desbravadores do então virgem território atonal (acho que estou pensando em Schoenberg, mas também Berg e Webern). E, de fato, uma oitava em Schoenberg, dependendo de como viesse, poderia desmontar todo o edifício - não que eu obrigue alguém a pensar em edifício para considerar a música, mas é a comparação que imaginei agora.

E usei a palavra "sonoridade" para a oitava por pensar nela realmente como um timbre, mais do que um intervalo.

Mesmo assim Arnold Schoenberg me desmente no seu op.11, Três peças para piano (Drei Klavierstücke), de 1909. Todas as três peças apresentam numerosas oitavas.

A primeira só um pouco, na verdade: a nove compassos do fim (54-58), alguns esboços melódicos na mão esquerda. A onze do fim (53-54), o tema principal com as quatro primeiras notas em oitavas. Logo em seguida há também várias tríades (é possível identificar um SibM7+, um Dó#m, um MibM9, aqui sem nenhuma função, embora seja impossível não perceber a relação de terças - compassos 54-56).

A segunda, com um ostinato fá-ré, reforça o fá com a oitava mais grave.

A terceira, já desde o começo, usa muitas oitavas na mão esquerda.

Mas não é isto que interessa aqui. Na primeira destas três peças, há vários trechos calcados explicitamente sobre a nona menor. Dou como exemplo um compasso (35) em que a mão esquerda executa as seguintes notas:



Minha intenção não é analisar Schoenberg, nem de longe. Acabei de fato falando um pouco mais do que pretendia, mas tudo bem. As Seis pequenas peças para piano (Sechs kleine Klavierstücke), op.19, de 1911, já não trazem oitavas.

Webern, sim, mais ortodoxo, foge completamente às oitavas. Nele é que se pode encontrar um uso da nona menor como uma "substituta" consistente da oitava - e não só a nona menor, mas sua irmã, a sétima maior, muitas vezes por meio do acorde que Flo Menezes chama de arquétipo Webern: quarta + trítono, ou trítono+quarta, num acorde de três notas que perfaz uma sétima maior (como dó-fá-si ou dó-fá#-si).

Isso é o que Menezes chama de arquétipo Webern de primeiro tipo, já que ele identifica um segundo tipo constituído de duas terças menores em distância de sétima maior - novamente, a sétima maior.

    Estas menções a Flo Menezes se referem ao seu livro "Apoteose de Schoenberg". Por ter lido esta classificação (e nomenclatura) de acordes, acabei me acostumando a chamar de "Webern" o que ele chama de "arquétipo Webern de primeiro tipo".


*

O primeiro acorde deste post, o fá-sib com fá#-si, vem da sétima das minhas Gravuras, de 1997.

    Continuarei o assunto das nonas menores num próximo post, possivelmente já no próximo.

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